Estreantes em Copas do Mundo costumam se situar em dois extremos: um time que se fecha, defende e tenta sair da competição sem dar vexame, ou uma equipe que atua sem responsabilidade, buscando o gol e tentando surpreender. A Bósnia de Safet Susic claramente se aproxima mais do segundo exemplo. A filosofia do treinador, considerado o melhor jogador da história do país, é ofensiva por natureza, colocando em campo vários jogadores que gostam mais de atacar do que defender e tentando sempre fazer um gol a mais que o adversário.
A postura de Susic é uma faca de dois gumes: devastadora quando dá certo, mas que pode parecer bastante ingênua contra oponentes de qualidade superior ou que apostam no contra-ataque. O treinador foi bastante criticado nos últimos meses pelo meio-campo pouco combativo, preferindo atletas mais habilidosos e lentos no setor. É pouquíssimo provável que tenhamos uma surpresa do tamanho da Croácia de 1998, mas o estilo técnico da Bósnia deve surpreender os desavisados na Copa.
Sistema aventureiro cria chances por todos os lados
Apesar de finalmente aceitar escalar um volante marcador, Besic, no amistoso recente contra a Costa do Marfim, a formação número 1 da Bósnia é um 4-4-2 em losango bastante ousado. O volante mais recuado, Medunjanin, não é nem de longe um marcador: apesar do bom posicionamento, seus pontos fortes são a visão de jogo e a técnica para distribuir passes com o pé esquerdo. À sua direita, Pjanic, “motorzinho” da Roma, ajuda a fechar o lado e vira um meia ofensivo com a bola; à esquerda, Lulic é o único jogador menos técnico, mas com muita energia e velocidade para marcar e defender pelo setor.
Mais à frente, o armador Misimovic é um camisa 10 à moda antiga, com habilidade para destrancar defesas, mas pouca mobilidade e nenhuma ajuda à defesa. O time tem ainda uma dupla de ataque clássica, com Dzeko e Ibisevic, dois centroavantes que se movimentam bem, são ótimos finalizadores de área e formam parceria afinada. O time cria chances com passes em profundidade, cruzamentos de Lulic ou do lateral Mujdza, tabelas pelo centro ou bolas longas para os centroavantes – a variedade de jogadas da Bósnia é bonita de se ver.
Defesa sofre com buracos na marcação
A força ofensiva da Bósnia, que marcou três gols por jogo nas Eliminatórias, tem um preço claro: o time é altamente vulnerável a contra-ataques ou a inversões de jogo rápidas, com buracos enormes na marcação. Como o trio de ataque pouco ajuda defensivamente, os três meio-campistas precisam cobrir uma faixa larga de campo, e um dos laterais sempre fica desprotegido. A situação é especialmente problemática na direita, já que Mujdza é um lateral bem ofensivo, e Pjanic muitas vezes fica centralizado e fora de posição para cobri-lo.
Outro defeito é no centro do campo, onde o ótimo Medunjanin não é um volante de marcação: com pouca mobilidade e eventuais avanços ao ataque, deixa espaço atrás de si e é presa fácil para meias habilidosos. O lado esquerdo é o setor mais resistente, já que Kolasinac é um lateral sólido na defesa e tem sempre um jogador disciplinado à frente de si, que ajuda na marcação, como Lulic, Visca ou Salihovic. Ainda assim, os zagueiros costumam ficar bastante expostos, e o time vai depender muito da atuação de Begovic, que pode ser um dos melhores goleiros da Copa.
Alternativa tática contra times mais fortes
O idealismo de Susic não foi tão grande a ponto de o treinador não ensaiar uma alternativa mais sólida defensivamente para jogos mais fortes, e é justamente essa variação que deve ser usada na estreia contra a Argentina. Ibisevic sai do time, deixando apenas Dzeko à frente, para a entrada de Besic, um típico volante marcador, de raça e carrinhos. O time naturalmente ganha poder de marcação e não fica tão dependente de um erro adversário para recuperar a bola, mas o ataque fica bem mais previsível.
Outra possibilidade é sacar Misimovic, que é praticamente nulo defensivamente, e colocar Pjanic na posição de armador central, abrindo espaço na direita para a entrada de Hajrovic, um ponta rápido e habilidoso do Galatasaray, que ajuda mais na marcação e seria mais perigoso no contra-ataque. Susic tem nas mãos boas peças para conseguir a classificação em um Grupo F que é um dos mais fracos da Copa, mas precisa demonstrar que, além da filosofia interessante de jogo, tem o pragmatismo para mudar as coisas quando não derem certo.
Jogador-chave: Pjanic. Em um meio-campo que se divide entre jogadores cerebrais ou velocistas, o atleta da Roma é o que mais se aproxima de uma mistura: com grande visão de jogo e qualidade de passe, também é dinâmico e sabe correr com a bola. Atua na maioria das vezes deslocado para a direita para acomodar Misimovic, mas costuma cair pelo meio e se tornar um armador extra. Sua melhor posição, porém, é centralizado, e talvez essa seja a resposta para sanar os problemas defensivos da Bósnia sem tirar potencial ofensivo.
Palpite: cai na primeira fase